Marília Mendonça nos deixou há 7 meses, mas será que seu nome ainda tem relevância no cenário atual da música sertaneja?
Quem acompanha o Movimento Country sabe que esta colunista sempre ressaltou as qualidades artísticas de Marília Mendonça bem antes do trágico acidente de avião que a tirou de nós e deixou uma nação inteira de luto. Já falamos por aqui sobre suas melhores canções e parcerias e eu não poupei elogios os projeto Patroas 2, lançado em 2021. Agora, sete meses após sua partida, será que já podemos refletir sobre a relevância da artista no contexto atual da música sertaneja?
Em um momento em que a rapidez dos lançamentos musicais de todos os estilos supera a capacidade de qualquer ser humano minimamente produtivo de se manter atualizado, em um cenário dominado por plataformas digitais de música, onde, cada vez mais, qualidade é medida pelo número de streamings de um artista ou canção, convém iniciar essa reflexão abordando o que, de fato, torna um profissional relevante.
Acredito piamente que os profissionais realmente relevantes, não importa a área de atuação, são aqueles que deixam lembranças positivas e ensinamentos, que tocam o coração das pessoas além do trabalho. Um cantor pode ser bom e não ser marcante. O contrário também pode ser verdade, já que há artistas que vocalmente são medianos, mas compensam na emoção da interpretação, no tratamento com os fãs, no bom coleguismo com seus pares. Quando alguém reúne o melhor desses dois mundos, surge o ícone. Marília é ícone. É, verbo no presente, porque nunca deixará de ser.
Ainda assim, se você acredita que números de execuções em plataformas digitais são sinal de relevância, Marília segue sendo a número um. Reina absoluta em todos os streamings, continua intocável em primeiro lugar. Por semanas, esteve na 1ª posição com “Mal Feito” e também na 7ª posição com a música “Vai lá em Casa Hoje”, com George Henrique e Rodrigo. A cantora também emplacou a música “Deprê” na trilha sonora da novela “Pantanal”. Ganha até de Henrique e Juliano no número de faixas nas paradas do Spotify. Seu canal oficial do YouTube segue rendendo muito.
Todavia, enquadrar Marília Mendonça nesse tipo de estatística para tentar medir a sua relevância é reduzir em muito a artista imensa que ela foi. Tem gente com pouco talento musical fazendo sucesso, em número surreal, diga-se. Sigo acreditando que o legado deixado por Marília Mendonça é imenso, e reafirmo que transcende a música, pois passa por questões intimamente relacionadas a comportamento, liberdade, combate ao machismo e o estímulo ao empoderamento feminino. Marília foi uma gigante da música, e igualmente imensa atrás do violão e do microfone, quando as luzes se apagavam.
A partida trágica de Marília Mendonça pode ter aguçado a curiosidade de alguns e até pode ser que um ou outro desavisado tenha passado a consumir sua música após o acidente. Mas não há comoção frente à tragédia que sustente a relevância de um artista por tanto tempo após sua morte se não se tratar de alguém realmente fora da curva. Hoje, sete meses depois, Marília segue fazendo sucesso e rendendo dividendos para sua família e para todos os que tiveram a honra de gravar com ela porque foi realmente muito diferente (e muito acima) da média em todos os aspectos. Muito se especula sobre quem ocupará seu lugar. Será que há alguém à altura? Duvido muito.
De forma alguma estou dizendo isso porque ela morreu cedo, porque estava estourada, porque colecionava hits um atrás do outro. A questão é que, em um universo onde tanta coisa mediana faz sucesso, cabe ressaltar que Marília Mendonça foi tudo menos medíocre. Ao contrário, foi inovadora, lutadora, forte, generosa e, ainda por cima, tinha um talento muito, mas muito fora da curva. Fez a diferença na vida de muita gente e seu impacto vai muito além do mero entretenimento. Marília foi um mundo inteiro de elogios dentro de uma pessoa só. Podemos lembrá-la e reverenciá-la por muitos meses mais e ainda vai ser pouco.
Sobre Dyala Assef: colunista do Movimento Country, escritora, professora universitária, fã de Marília Mendonça e ouvinte voraz de todos os estilos de boa música.