Lauana Prado, com o recém lançado álbum “Natural”, tem pela frente o enorme desafio de manter a qualidade e o sucesso alcançados pelo trabalho anterior, que foi indicado ao Grammy Latino em 2020
A cantora Lauana Prado lançou nesta quinta-feira (30) a primeira parte do álbum “Natural”, gravado na bela região do Jalapão, no Tocantins. O novo trabalho da sertaneja tem pela frente o grande desafio de não apenas repetir o sucesso do álbum anterior, “Livre”, que foi indicado ao Grammy Latino na categoria Melhor Álbum de Música Sertaneja, mas também entregar canções de boa qualidade que ajudem a consolidá-la como um dos principais nomes do feminejo no Brasil.
Lauana estourou no cenário sertanejo nacional nos idos de 2018/2019 com o hit “Cobaia“, composição do genial Bruno Caliman, um dos meus compositores favoritos do segmento e autor de grandes sucessos de outros artistas já consagrados. É dele a linda “2050”, gravada por Luan Santana e “Domingo de Manhã”, uma das responsáveis pela projeção nacional da excelente dupla Marcos & Belutti. Depois da ótima “Cobaia”, fiquei um tempo sem ouvir falar muito de Lauana e já naquela época achava que a moça merecia ser reconhecida como bem mais do que uma artista que emplaca uma música só.
Em 2020, o reconhecimento devido ao ótimo trabalho de Lauana Prado veio com a indicação ao Grammy, e com números bastante expressivos de streams no Spotify e no YouTube da versão deluxe do álbum “Livre”, que traz uma regravação de “Cobaia”. Os arranjos e a produção musical desse projeto são de Fernando Zor, da dupla com Sorocaba, que sempre mostra extrema competência nesse tipo de trabalho. Gosto bem mais de Zor quando vira notícia por produzir boa música do que quando se fala dele pelo seu relacionamento iô-iô com a cantora Maiara, dupla de Maraisa. Fernando também canta com Lauana em “Passarinho que Voa”, e se você não conhece essa canção, recomendo que ouça.
Com a pandemia e a paralização da rotina de shows, Lauana Prado teve mais tempo para se dedicar à concepção do novo álbum “Natural”, e o envolvimento da artista em todas as etapas do processo, desde a composição de diversas faixas até a escolha do local de gravação, rende bons frutos. Trata-se de um trabalho muito bem feito de uma cantora carismática, segura de si e dona de uma voz marcante. Isso que ainda estamos diante do lançamento apenas da primeira parte. São sete canções que falam de temas distintos e que mostram que Lauana é uma compositora inteligente e uma intérprete versátil.
A primeira faixa de trabalho é “Zap”, com vídeo já disponível no YouTube, que faz referência à maneira peculiar do brasileiro se referir ao aplicativo de mensagens mais popular no país. O título, obviamente escolhido sob medida para dar força viral à música, combina bem com a linguagem coloquial que traz termos do nosso dia-a-dia. Mas, escondida atrás dessa terminologia simples, há uma triste história de uma relação que parece estar com os dias contados, em que um dos envolvidos precisa implorar por um pouco de atenção. É a escolha certa para abrir a divulgação do álbum, pois me parece a canção com maior possibilidade de virar hit.
“Pegada Fraca” é a que menos me agradou, mas pode embalar bem um churrasco entre amigas, quando a mulherada se junta pra bater papo e acaba trocando impressões sobre um(a) ex que já foi embora tarde ou aquela pessoa que não tem a pegada forte o suficiente para mantê-las por perto. Um choque de realidade na auto estima de muita gente que se acha bem melhor entre quatros paredes do que realmente é (eu sei que você aí até já pensou em algum nome quando leu isso).
Seguindo a sequência do álbum, vem a bela “Filtro dos Sonhos”, mais lenta e melódica, sobre um amor que surpreende e dá certo. Gostei muito dos melismas discretos, porém precisos, que Lauana entrega em alguns trechos da música, especialmente no final das frases. Quem conhece um pouquinho de técnica vocal sabe que essa modulação na voz não é fácil de fazer, e tá cheio de cantor por aí que não conseguiria fazer isso nem em mil anos. Além disso, dosar os melismas para que não fiquem cansativos é mais uma qualidade de Lauana como cantora. Aplaudi demais!
Quando ouvi “Brecha”, pensei que poderia definí-la como a gourmetização da traição, ou seja, pegar uma coisa muito simples (e, no caso, muito feia) e vestir com palavras bonitas e desculpas clichês para justificar o injustificável. Não é única canção sobre traição que faz isso; eu poderia trazer uma lista delas. Como muitos pratos gourmet, “Brecha” é bonita e apetitosa, e deixa o ouvinte satisfeito.
“Você Mitou” e “Lábia” me pareceram variações sobre o mesmo tema. Você conhece alguém, rola aquela conexão, papo envolvente, uns beijos quentes e, de repente, você vai parar na cama da pessoa e se apaixona porque a performance é algo espetacular (quem nunca?). Temática bem moderninha e atual, que aqui rende duas canções interessantes. Aliás, preciso comentar que nas letras Lauana se mostra antenadíssima a esses tempos modernos que vivemos hoje, que se por um lado são recheados de encontros casuais (e superficiais), deixam no coração de muitos a angústia causada pelas relações voláteis e que terminam por qualquer bobagem.
A primeira parte de “Natural” termina com “Oi de Lá”, linda e triste do jeito que eu gosto (sim, eu admito!). Fala daquele momento duro quando você entende que a pessoa amada não está mais nem aí, mas mesmo assim você não consegue desapegar. Tive que colocar pra repetir, porque a canção tem apenas pouco mais de um minuto de duração e uma estrutura pouco convencional, sem pontes ou repetição de refrão. Costumo gostar dessas apostas meio diferentes. Colocando a música no repeat pra “sofrer” por mais tempo, os ouvintes geram para Lauana mais streams, mais receita e assim os números do sucesso vão subindo. Esperta a moça (e também sua equipe de divulgação e seu produtor musical Gabriel Pascoal).
Pode ser até que “Natural” não repita a indicação ao Grammy de seu antecessor, mas não acho que isso tenha qualquer relevância. A própria Lauana Prado, em uma coletiva de imprensa nesta quinta-feira (30), que contou com a presença do Movimento Country, se mostrou muito pé no chão quanto a isso, admitindo que o projeto não tem como intenção primordial mirar em prêmios. A cantora declara que seu objetivo é entregar um trabalho de qualidade que emocione as pessoas. Parabéns, Lauana! Pelo menos nessa primeira parte do álbum, objetivo alcançado.
Sobre Dyala Assef: Escritora e colunista do Movimento Country, professora universitária, cantora amadora nas horas vagas e amante de todos os tipos de boa música.